sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Idosos evitam sair de casa na Grande BH por receio de assaltos e más condições das vias

Pesquisa da UFMG sustenta que estrutura urbana interfere na saúde dos mais velhos

Paola Carvalho - Estado de Minas
Publicação: 27/01/2012 06:00 Atualização: 27/01/2012 06:58



Não é por falta de médico pedir que a aposentada Nízia Diniz, de 84 anos, moradora do Centro de Belo Horizonte, não faz atividades físicas. Ela sente dores, principalmente nas costas e no braço. Tem artrose. Mas, para ela, é melhor ocupar a cabeça com bordado do que sair na rua. O que a impede são as condições das calçadas, do trânsito e o receio de cair ou ser atropelada. Já foram cinco tombos, e em dois teve de ser socorrida, tomar pontos e ficar de molho em casa. “Gosto muito de conversar com porteiros de hospital. Uma vez um até perguntou: ‘Outra vez a senhora por aqui?’. Hoje eu só saio para ir à padaria e, mesmo assim, levo a empregada”, conta.

Nízia faz parte de grupo de idosos da Grande BH que têm medo de sair à rua pela dificuldade de se locomover ou pelo receio da violência. O número é grande. Pesquisa feita com 1.611 idosos em 24 municípios da região e que integra tese de doutorado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), premiada em 2011, mostrou que 78% dos entrevistados têm medo de sair por causa de assaltos e 62% em virtude das más condições das calçadas. Desenvolvido pela fisioterapeuta Fabiane Ribeiro Ferreira, o trabalho indicou que o lugar onde se mora pode influenciar a saúde e a independência dos idosos. “A performance funcional e a qualidade de vida são influenciadas pela estrutura urbana”, diz Fabiane.

Segundo o estudo, a estrutura da vizinhança em Belo Horizonte contribui para que 68,4% dos idosos sejam sedentários em seu horário de lazer e apenas 21% sejam fisicamente ativos. “Verificamos que o medo de cair por causa de defeitos na rua é muito frequente e está significativamente associada ao desempenho

funcional desses idosos”, diz Fabiane.
Senhoras na Praça da Liberdade: vizinhança influencia qualidade de vida (Juarez Rodrigues/EM/D.A PRESS)
Senhoras na Praça da Liberdade: vizinhança influencia qualidade de vida


Odalino Souza, de 61 anos, não consegue mais subir a rua onde mora a vida inteira, no Bairro São Lucas (Região Leste). O chefe de obras se aposentou há sete anos. “O médico indica caminhada para a artrose não piorar. Mas meus joelhos não suportam as ruas daqui”, reclama. A ladeira é tão íngreme que as rampas de garagem se transformam em bloqueios para a passagem. O desvio tem de ser feito na rua, onde carros descem em alta velocidade. Perto dali, Iraci Gonçalves já teve de fazer fisioterapia para reduzir as dores no joelho. “É muito custo sair de casa, dependo de carona dos filhos. Melhor ficar quieta”, diz. O medo de cair se transforma em números no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII (HPS), no Funcionários (Região Centro-Sul). No ano passado, 2.910 idosos deram entrada na emergência por causa de quedas.

O aposentado Genovais Durães, de 68 anos, morador do Bairro Ribeiro de Abreu (Região Nordeste), lamenta também a limitação de sair de casa por medo de violência. “A atividade fica limitada demais porque a caminhada acaba se transformando em um momento de tensão, em que você tem de ficar prevenido por causa do risco de assalto. Então, é preferível nem sair”, afirmou. Para tomar um fôlego, muito de vez em quando ele atravessa a cidade para ir à Praça da Liberdade, no Funcionários (Região Centro-Sul). “Aqui tem banco público, passeio plano e em bom estado de conservação, além de muitas sombras. Deveria ser assim em toda a cidade.”
Crescimento
Do total da população brasileira 10,8% são idosos – considerados aqueles que têm mais de 60 anos de idade, de acordo com o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estima-se que esse índice dobrará até 2050. Minas Gerais está acima da média nacional em número de idosos, com 11,8% dos habitantes (cerca de 2,3 milhões). Belo Horizonte, por sua vez, supera com percentual de 12,6% (em torno de 300 mil). “O processo de urbanização é acompanhado pelo processo de envelhecimento da população mundial. Os idosos são uma parte da população em que as mudanças do ambiente físico e social causadas por essa mudança exercem forte influência”, diz Fabiane Ferreira.

A Secretaria Municipal de Saúde informou por meio de nota que a cidade “conta com uma ampla rede de atendimento aos idosos, que envolve acompanhamento especializado, atividades físicas e de prevenção de doenças”. Entre as principais medidas estão as 42 Academias da Cidade, para prática de exercícios físicos; as 14 equipes do Centro mais Vida, onde especialistas abrem as portas para exames preventivos; e o Programa Cuidador de Idosos, que hoje atende 427 pessoas acima de 60 anos.

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